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Poderá a visita do Papa ao Líbano moderar as ameaças israelitas e reparar as divisões políticas?

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BEIRUTE – A chegada do Papa Leão XIV a Beirute – a sua primeira viagem ao estrangeiro desde que ascendeu ao papado – ocorre num momento em que o Líbano se encontra entre a escalada das ameaças israelitas e uma classe política presa numa divisão crónica.

Durante dias, a visita eclipsou todas as outras notícias, à medida que ruas, ecrãs e salões políticos a enquadravam como um evento nacional definidor. O Vaticano apresentou a missão como um gesto de solidariedade para com uma nação ferida; A liderança do Líbano, entretanto, viu nele uma rara oportunidade de projectar a unidade e restaurar a relevância internacional.

Mas a visita rapidamente transcendeu o simbolismo espiritual e entrou no domínio da política dura.

O Presidente Joseph Aoun – alvo de rivais desde o primeiro dia do seu mandato – aproveitou a ocasião para reafirmar a sua autoridade. A coordenação bem-sucedida de uma visita desta magnitude permitiu-lhe desafiar as tentativas de o marginalizar, proporcionando o que um conselheiro chamou de “uma onda de legitimidade papal” a uma presidência assediada por sabotagem interna.

O Hezbollah também agiu com notável precisão política. Em vez de se distanciar, o partido abraçou plenamente a visita, sublinhando o seu papel como parte integrante do Estado libanês.

Deputados do Bloco Lealdade à Resistência compareceram à recepção oficial; o partido emitiu uma declaração de boas-vindas; e os Escoteiros al-Mahdi permaneceram ao longo da rota do comboio agitando bandeiras do Vaticano.

Estas cenas, transmitidas pelos canais árabes do Vaticano, desafiaram inadvertidamente as narrativas ocidentais que lançavam o Hezbollah para fora do tecido nacional.
Por um breve momento, os holofotes globais documentaram um Líbano no qual o Hezbollah não parecia nem isolado nem antagónico.

O Presidente da Câmara Nabih Berri acrescentou a sua própria marca ao apresentar ao Papa um livro que narra a viagem de Cristo através do Sul do Líbano – uma lembrança implícita de uma região que continua a suportar violações rotineiras por parte de Israel.

Enquanto isso, surgiram teatros políticos menores. As queixas públicas do deputado Sethrida Geagea sobre o protocolo de convite revelaram que a visita reorganizou antigas rivalidades e expôs as inseguranças dos partidos tradicionais não habituados a serem ofuscados.

No entanto, por baixo da coreografia reside a questão central: poderá a presença do Papa conter de forma significativa a escalada israelita – ou inspirar as facções libanesas a recuarem da beira do abismo?

Nos seus sermões e discursos públicos, o Papa transmitiu mensagens que atingiram directamente a ferida política do Líbano: curar a memória colectiva, rejeitar a guerra como conveniência política e restaurar o vínculo entre governantes e povo.

A sua cautela contra os líderes que “se distanciam daqueles que afirmam representar” funcionou como uma crítica velada à elite isolada do Líbano. Ele também repetiu a visão do Presidente Aoun do Líbano como uma pátria de pluralismo e igualdade, não um campo de batalha para o maximalismo sectário ou uma tela para fantasias federalistas promovidas pela extrema direita.

Ainda assim, a autoridade moral tem limites. Como observaram as fontes, o Papa não comanda exércitos nem redige políticas regionais. O seu impacto reside na formação da opinião internacional – e na garantia de que as capitais ocidentais, especialmente Washington, ouvem avisos sobre a estabilidade regional e o aventureirismo israelita num momento delicado.

Mas a crise do Líbano é mais profunda do que qualquer convergência simbólica. A classe política do país aperfeiçoou o desempenho da unidade, mantendo divisões arraigadas após a saída das câmaras.

As ruas polidas às pressas para o pontífice logo voltarão à decadência; facções rivais retomarão pequenas guerras de trincheiras; e as ameaças israelitas – enraizadas em cálculos estratégicos e não em apelos eclesiásticos – não desaparecerão com um sermão.

Mesmo assim, a visita revelou algo que o establishment político muitas vezes nega: o Líbano ainda possui a capacidade latente de aparecer, mesmo que momentaneamente, como um sistema político em vez de uma manta de retalhos de seitas e rancores.

Se esta rara coerência se tornará um catalisador para uma consolidação nacional genuína – ou simplesmente outro espectáculo efémero – não depende de Roma, mas de Beirute.

O Papa ofereceu ao país um espelho. O que o Líbano escolhe ver é agora um teste político, não espiritual!



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