O setor vive no boom da inovação, mas enfrenta concentração e alta carga tributária; Presidente da entidade diz que o imposto seletivo seria prejudicial ao setor
O setor de cerveja no Brasil tem um contraste. Por um lado, a multiplicação de novas cervejarias, especialmente a artesanal, aumenta a diversidade de rótulos e sabores disponíveis. Por outro lado, a forte concentração de mercado, com apenas 3 empresas, que representam 96% da produção no país.
De acordo com o Presidente da Sindcerv (União Nacional da Indústria de Cerveja), Márcio Maciel, o Brasil acrescenta hoje 1.949 cervejarias, espalhadas por 790 cidades. É um crescimento exponencial em comparação com o início dos anos 2000, quando havia apenas 40 fábricas.
Como resultado, existem mais de 55.000 marcas registradas no país, um número que excede a União Europeia – que é de 50.000.
“As empresas entenderam que o mercado queria inovação. Esse é o resultado. É um setor que emprega e está em 790 cidades em todos os estados. Cada 109.000 brasileiros, você tem uma cervejaria”, diz Maciel em entrevista à Power360.
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Em relação à concentração do mercado, Maciel diz que esse é um recurso de mercado em todo o mundo, devido à necessidade de escala para que o preço seja reduzido. “Nos Estados Unidos, existem 4 cervejarias com a maior parte do mercado”, ele se compara.
Maciel tem 44 anos e presidiu Sindicerv desde 2023. Graduado na UNB (Universidade de Brasília), possui um mestrado em políticas públicas pela IDP (Instituto de Direito Público). Ele trabalha há 20 anos com relações governamentais, especialmente em áreas relacionadas à indústria agro.
Tendências globais, como cervejas sem álcool e sem glúten, já possuem espaço relevante no mercado nacional e estão avançando. Em alguns anos, o consumo de zero opções de álcool saltou 500%, atingindo 757 milhões de litros por ano. Glutenless, que chegou ao Brasil em 2020, mais que dobrou a produção em 2024. Os dados foram consolidados no anuário do setor, lançado no início de agosto. Leia o completo (PDF – 24,7 MB).
Apesar do boom criativo, o setor enfrenta limitações estruturais. A produção estabilizou em 2024, que Maciel atribui a uma maturidade no mercado. A alta carga tributária – responsável por 56% do preço da cerveja – é apontada como um dos principais obstáculos ao crescimento. O setor espera a regulamentação da reforma tributária, que ainda pode escorregar nas cervejarias.
“Se o imposto seletivo for descalibrado, pode ter um impacto significativo em um produto popular e sensível ao preço”, diz ele.
Maciel argumenta que o Brasil segue os padrões internacionais na coleta de impostos, com base no teor de álcool e não nos modelos que penalizam categorias específicas. Ele argumenta que a cerveja faz parte da cultura nacional.
Leia trechos da entrevista:
POWER360 – O país viveu um boom na abertura de novas cervejarias, especialmente artesanais. Quantas cervejarias o Brasil tem hoje?
Márcio Maciel – existem 1.949. No ano passado, 102 cervejarias foram abertas. A maioria é pequena, de empresários com paixão por cerveja. No início dos anos 2000, eram 40. Em 2013, 195. Foi um salto gigantesco. A partir de 2010, começa a importação e profissionalização do mercado. Pessoas fazendo cerveja em casa e depois expandindo. É o resultado de uma melhoria na renda. 15 anos atrás, havia poucas opções de cerveja. Hoje há cerveja, robusta, azeda, IPA, feita com maracujá e café. As empresas entenderam que o mercado queria inovação. Este é o resultado. Existem 55.000 marcas de cerveja no Brasil em comparação com 50.000 da União Europeia. É um setor que emprega e está em 790 cidades em todos os estados. A cada 109.000 brasileiros, você tem uma cervejaria.
De onde vem as máquinas?
A indústria da cerveja é um amplo ecossistema que vai do campo ao vidro. Possui máquinas, plantação de cevada, lúpulo e outros insumos. A maioria das máquinas é importada, mas a indústria nacional começa a produzir máquinas. A Heineken está construindo seu parque de tecnologia mais avançado em todo o mundo no Brasil, em Passos (MG). E usa tecnologia em todos os lugares. Hoje, 60% da cevada é nacional e cresceu. O salto é 99% importado. E o ecossistema de embalagem é nacional. A indústria da cerveja gera 2,5 milhões de empregos, de acordo com a FGV. Com cada trabalho em uma indústria de cerveja, existem 34 no sistema.
Em uma entrevista ao Power360, Márcio Maciel disse que a expansão da produção de fabricação faz do Brasil um dos principais inovadores do setor
E qual é a receita anual para a indústria da cerveja?
Pagamos US $ 50 bilhões em impostos por ano. A carga tributária é extremamente alta. O maior da América Latina. Cerca de 56% do valor da cerveja é imposto. É um setor que gera na casa de US $ 200 bilhões em receitas. Hoje, três empresas têm 96% do mercado: Ambev, Heineken e Petrópolis.
Apesar do boom das novas cervejarias, o mercado está bastante concentrado …
É uma característica dessa indústria em todo o mundo. Nos Estados Unidos, existem 4 cervejarias com a maior parte do mercado. Você precisa de escala. Quando tem dificuldade e alta carga tributária, é importante que você tenha uma escala. Grandes cervejarias se concentram em servir a população em geral. Mas não há tantas inovações ousadas em escala. Geralmente, é testado antes. E quem faz isso no mercado de cerveja são as pequenas cervejarias. Não é o sabor de todos que gostam de um carregador – também escuro e pesado. É bom ter concorrência. Traz novos sabores, novos tipos de cerveja e novos consumidores ao mercado.
Houve um aumento no consumo de cerveja sem álcool e sem glúten. Por que?
Cervejas Alcoholless disparadas dentro de 150 milhões de litros a 757 milhões – 500%. É 5% do mercado. Zero Beer existe desde a década de 1970. Mas havia muitos processos para remover o álcool e acabaram gerando outro sabor, que não foi tão bem aceito no mercado. Na última década, a indústria em todo o mundo investiu US $ 10 bilhões em pesquisa para criar maneiras de remover o álcool, não o sabor. Hoje eu tenho uma cerveja como cerveja, apenas sem álcool. Ele conhece as pessoas que precisam dirigir, que estão tomando antibióticos. A política de negócios está sempre tendo a opção de álcool zero em todos os lugares que vendem cervejas normais.
E a opção livre de glúten também está crescendo muito.
Mais que dobrou no ano passado. É uma inovação ainda mais recente. No Brasil, chega em 2020. É produzido com muito cuidado, não pode ter um risco de contaminação e está resultando.
A exportação também cresce. Quem compra do Brasil?
O Brasil é um excedente de cerveja, vende mais do que comprar. Exportamos para 79 países. Mas nosso mercado principal é a América do Sul, especialmente o Paraguai e a Bolívia. A cerveja é um produto local, precisa ser fresco. E estamos exportando porque a qualidade da cerveja brasileira salta aos olhos do mundo. É o terceiro maior mercado, atrás da China e dos Estados Unidos. E também existem barreiras tarifárias. Exportamos principalmente a cerveja nacional, leve e refrescante, com 4,5% de teor de álcool. É um produto que você bebe equilibrando com água. Na importação, trazemos principalmente da Alemanha. Hoje não precisamos importar para beber cervejas específicas. Em termos de diversidade, estamos muito próximos do mercado por aí.
É resultado de cervejarias menores?
O Brasil já tem sua própria escola, Catarina Sour, uma cerveja um pouco mais ácida, com ingredientes cítricos. Está diversificando o portfólio. E a inovação vai além da cerveja, está em embalagens, no processo de produção. Estamos inovando muito.
Mas no ano passado houve estabilidade no volume de cerveja produzida. É um platô?
Não falamos sobre platô, mas um mercado maduro de fabricação de cerveja. Os grandes impulsos para as vendas de cerveja são preço, clima e renda. O preço é um tema sensível para o consumidor brasileiro. O clima é um dos mais propícios. E estamos vendo um pico histórico no salário médio do brasileiro. Acreditamos que o setor tem resiliência. E todas as grandes cervejarias estão investindo em expansão fatorial, distribuição. Em uma pesquisa recente, 85% dos brasileiros disseram que abrir uma cerveja faz parte de nossa cultura e 88% que gostariam de ter mais tempo para gastar em amigos e familiares tomando cerveja. Ainda em ascensão.
Do ponto de vista regulatório, como o imposto seletivo, que começou com a reforma tributária, pode impactar o setor?
Significativamente. Hoje, 56% do preço da cerveja no Brasil é imposto. Se tivermos um imposto de decepção que não dialoga com o princípio básico da reforma, a neutralidade, podemos ter um impacto. Queremos o imposto padrão da OCDE, seguindo as melhores práticas que funcionam no mundo. Tributo ao álcool de acordo com o volume de álcool. Esta é a recomendação de quem, Banco Mundial, FMI. A cerveja é um produto popular, muito sensível ao preço.
A tarifa de Donald Trump afeta de alguma forma o setor de fabricação?
Diretamente, não. Exportamos muito pouco para os Estados Unidos. Mas, sem dúvida, você tem um impacto na economia. Estamos esperando para entender quais serão esses impactos indiretos, não apenas no Brasil, mas na União Europeia e em outros países, o que pode afetar os insumos.







